Emigrante?
España ou "tierra de nuestros hermanos"? Digiro esta cogitação à 7 anos

(se bem que a subtileza pode escapar ao leitor mais distraído, certamente que concorda que na primeira premissa se considera España ou como país irmão que não tivemos oportunidade de escolher e quiserem as Sortes ou o azar de nos ter caído este na rifa)

Considero-me emigrante!

Pronto já 'tá, já disse... esta afirmação já foi palco de apaixonadas tertúlias e mais acaloradas discussões que acabam envoltas numa nuvem de fumo entre mim, o meu pai e o Jorge (que apesar de ser irmão do meu pai não tem, mas vai aparentando, idade para ser meu tio).
Considerando que representamos três gerações (em termos de idade) da Casa Veiga e todos temos como prototipo de emigração a praticada pelo meu avô que na falta de pão que pôr na mesa e graças ao seu orgulho e feitio peculiares (trademark Veigas®) fez-se à estrada e 1 mês depois 'tava em Paris a braços com o xenofobismo francês, a viver nos batiments, suando de sol a sol a miséria de soldo que empregava na alimentação do hoje bem nutrido meu pai. Vivia portanto com um pé cá e outro lá! E naturalmente todos temos uma interpretação diferente da emigração.


O meu pai, boca pequena que teve na base da peregrinação em busca de um lugar ao Sol, nunc se acomodou à noção de sair do país para viver melhor, já que viu o periodo inicial de uma emigração que estava disposta a comer o pão que o Diabo amassou fora do país em condições deploráveis por uns tostões mais e que depois de uma vivência de abnegada autocomiseração a que os emigrantes portigueses se dedicavam e que imprimia uma violenta autoexclusão num país de base racista e xenófobo como é França dos anos 60 para os emigrantes (não para o turista) e que se demonstrava numa violenta alergia a assimilar a cultura que para o pequeno português era sempre devassa, demasiado progressista e até alienígena cuja prática abanava as fundações do português habituado às convenções retrógradas baseadas na familia pátria e estado que predicava a cartilha e que para além de resultar um puzzle intricado saber como e que aquela gente ainda se aguentava como sociedade representava o camminho mais rápido para o inferno de ser feliz fora da pátria que o exilava por este ou aquele motivo aniquilando esse sentimento tão português da Saudade. Assim o meu pai vê o emigrante como um ser estúpido que à partida não funcionou como devi na sociedade se precisa de fugir para longe para ser feliz, mas que cronifica o seu estado se quando no estrangeiro não aprende a língua, não fala com o nativos,  não arranca todas as raízes que o atam sociologicamente ao Portugal profundo de onde pelas vicissitudes da Vida teve de sair para se entregar de braços abertos, mergulhando na cultura de cabeça do sítio para que depois renasça como ser mais completo, rebaptizado pela miscenização de costumes e tradições que farão desse emigrante a principio estúpido e mesquinho na sua critica fácil das suas origens e na idolatrização hipócrita dos seus novos Senhores uma pessoa melhor, mais esclarecida e como não há machado que corte as sementes que se plantam neste país de brandos costumes tão interligado com as viagens ao largo da sua história, mais português.


O Jorge (meu tio) que pelos famosos pêlos na "benta" que caracterizam as mulheres portuguesas cá fora (a sério ainda hoje não percebo porque é que a imagem que se vende de Portugal cá fora é a da típica senhora de luto sentada à porta de uma casa de granito com um bigode que faria empalidecer o Zé da tasca, mas pronto...suponho que se entende o que quero dizer com pelos na "benta", expressão tipicamente nortenha), viveu em França, já que a minha avó cansada do papel de esposa à distância, rompeu convenções e estilismo da época dando também ela o "Salto" levando a "cria p'a lá do sol posto. Apesar de ter regressado antes do meu avô que por lá ficou até à reforma, trazido após a violenta e precoce morte da minha avó que não teve "tempo" para lutar com os problemas de saúde que tinha e entregue aos cuidados da minha bendita tia-avó  e que portanto sofreu o tipico sindrome de filho de retornado. Pensava que tinha uma doença nos ouvidos, já que não entendia esse linguajar das gentes da terra que diziam que era sua e que com o tempo guarda a recordação da ordem e disciplina que era lá e cá não, do dificil que é lá e cá uma bandalheira mas aprendeu a desaprender o pouco que penetrava na dura crosta dos bairros sociais onde encatrafiaram os portugueses que iam trabalhar e  que por isso viu apenas as dificuldades de quem trabalha no duro, no mais puro ambiente de exclusão, no fundo da cadeia alimentar e que sacrificava o que de melhor nos caracteriza como portugueses ( a hospitalidade, a politica de cassa aberta, o sentido de colectivo) em prol da competição pura e dura... portanto o emigrante é a grandes rasgos para ele um ser sacrificado que trabalha, que luta, que arranha e morde para conseguir um lugar ao sol...




Chamam-me a mim o emigrante de luxo... Incomoda-me, insulta-me e sacode-me cada fibra do meu espirito protestante (nao no sentido religioso) Faz parecer que isto aqui é tudo fantástico e que corre sempre tudo às mil maravilhas, vamos como se não tivesse saido de casa/Portugal


Sei que não vim para Espanha a pé com o meu avô, nem se decidiu do dia para a noite, nem tive que passar fronteiras sem papeis, não tive que fugir da polícia, não ia sem destino fixo nem tão pouco sozinho, não era propriamente inepto no que toca à língua e nem tinha só a 4ª classe, mas ei!... não foi propriamente um mar rosas, nem um passeio no parque...
Para começar reportem-se à estupidez dos 17/18 anos e na embriagante onda doce hormonalmente complexa (não a da adolescência, mas a da  loucura das descobertas dos recém entitulados jovens) e o americanizado refrão do "livin' in the fast lane" que caracterizava a minha ascensão meteórica em termos sociais na altura e espetem-lhe com uma dose de 10/12h de viagens mensais em transportes públicos para poder vislumbrar um atisbo do que poderias ter sido, se tivesses umas décimas mais, por entre os companheiros que se iam diluindo nos km's que te separavam de casa...juntem-lhe o desespero de um ser comunicante como eu de encontrar-se de malas à porta de uma residência universitária que com o seu cristalino espanhol recém aprendido ficava muito aquém da exuberante exigência linguística que um idioma rico em expressões idiomáticas e regionalismos e influências nacionalistas como é o espanhol e ainda mais em "putos" recém soltos no vazio de vigilância e apertado control que se vive até estares sozinho a kms de distância de casa no mundo que é a vida Universitária. Acrescentem-lhe o mau sabor de boca com que ficamos quando sabemos que o teu grupo de amigos e os relacionamentos que terás numa residência universitária é determinado quando dizes Hola! pelo que trazes vestido pelo relógio tens, qual é o tamanho da mala e principalmente pela frase que dizes a seguir (acreditem soy portugués não é o melhor "ice breaker")! Yap! vivemos na era das primeiras impressões, vivemos bombardeados por informação pelo que tendemos a selecionar o indispensável e num mundo cada vez mais global acabamos cada vez mais com o olho no umbigo e dentro da nossa borbulha. Mas isto seria igual aqui, em Lisboa ou em Castelo Branco,...não fosse o facto de seres o único português em León e portanto o bicho raro, mas não o bicho raro exótico que todos querem provar, mas o aquele que Ei! o que é que estás a aqui a fazer?
Foi mau mas estava prestes a tornar-se pior... depois de um ano em León do qual só tenho coisas boas a dizer (fica para outro post), mas onde me deparei com um Falangista que não morria de amores pelos estrangeiros, com o dinheiro que se gasta em tudo e os meus pais que não nadavam nele (533 € mês era o preço da residência por bico em quarto compartilhado), com a dificuldade de estudar em Espanhol, com as saudades de casa, da moça que deixei em Lisboa, dos amigos que tinha em Vizela, vim parar a Valladolid.


Meu Deus! os tempos são diferentes eu não sou mão de obra barata, dentro da sociedade o estatuto de estudante superior e ainda por cima de Medicina confere-me um certo status, mas passei mais depressa a cidadão de segunda categoria do que um português demora a dar a volta aos temas principais dos debates em Portugal (sexo, política, futebol, [religião], sexo). 
Entre muitas outras, a título de exemplo:
  • a tinta ainda secava no contrato que assinava para ficar num apartamento (no quinquagésimo apartamento que visitava) e pedem-me o Bilhete de Identidade. Saco do BI, aquela bonita manta amarela que não cabia em nenhum dos compartimentos das carteiras, vá se lá saber porquê e a senhora solta a seguinte pérola: "Ai cariño pues vaya, es que mira.... verás... yo no alquilo el piso a estranjeros!" e sem mais contemplações delicadamente me mostrou a porta e já está
  • comentando esta história com a nada mais nada menos que directora do Banco Santander Central Hispano ouves outra pérola de relevo: " verás tienes que entender que en España, tenemos la idea de que la gente de Portugal suele estar asociada a los gitanos,entiendes lo que te quiero decir?"
  • ainda no mesmo banco tenho que fincar o pé e provar deitando mão da legislação Europeia que sendo comunitário tens pleno direito, como cidadão español, pelo que não têm que cobrar-te uma fiança de 15€ de gastos de qualquer "gillipollez" que se inventaram, para e cito o que me foi explicado no banco que segundo eles era politica interna do banco: "asegurar el banco contra un eventual delito de identidad, desinformación o utilización de los servicios bancarios prestados por la entidad bancaria en actividades ilícitas, criminales (...)"
  • ainda na mesma semana deparar-me com o pulso competitivo dos meninos de bem que caracterizavam a amostra inicial dos que como eu tinham sido exilados de Portugal pela sua escolha de vocação; e as intrigas e governos sombra que influiam sobre as relações entre os membros
  • mas o pior, pior, pior foi cair outra vez de paraquedas numa faculdade principalmente endógama, onde todos os alunos se conhecem desde 1º da escola primária e onde os grupos eram tão herméticos que de cada vez que chegava um outsider só lhe faltava gritar: "Então que é que queres? Dá-se pão aqui, é?"
E tudo isto não passam de anedotas, coisas que se contam à lareira que "a toro pasado" dão para mandar umas risadas, mas isto são os casos curiosos que posso contar, à coisas que só se entende se experimentadas e mais uma vez digo em nada se compara a uma emigração de um Keniano para os Estados Unidos com apenas o dinheiro da viagem ou de um marroquino em barcaça da mauritânia para as ilhas canárias sem sequer visto, mas lá está ainda na sexta quando falava com o meu Prof de Oftalmo, isso de ser cidadão de 2ª categoria não é muito saudável.
Mas mais uma vez dado que lutei o suficiente para abraçar tudo o que podia experimentar da cultura espanhola, a cada avanço que fazias e te adentravas neste ou naquele costume tinhas que "hacer el ridiculo" como por exemplo passar tardes a fio a tentar dominar a arte de comer "pipas" para que pudesses ver um jogo de futbol como um tipico espanhol, no café, com uma cerveja e a comer sementes de girassol e a atirar as cascas para o chão.

Isso sim para ser um esopanhol a sério tens que te decidir, ou és do Barça ou do Madrid tema do qual eu fugia desde que me lembro de ser pessoa porque nunca até então me tinha interessado por futbol, pois toca a aprender quantas taças da europa tem o Madrid ou quantas copas del rey ganhou o barcelona ou quantas vezes é que foi roubado o Bétis no derbi com o Sevilla. 


Mas faças o que faças Espanha is the best, em tudo o sentimento de nacionalismo em parte motivado pela divisão interna que é agravada pelas regiões autónomas e que não é mitigada pela figura do rei como se pensa além fronteiras que é apenas um representante do fraco "pegamento" que une os retalhos. Como português convicto não creio que Espanha seja a cúspide do povo mediterraneo nem tão pouco os mais "exitosos", no entanto sempre que falava com alguém soava-me como unhas num quadro de xisto aquilo de "fui a protugal a por toallas" ou "que mal conducen los portugueses" ou "porqué las mujeres portuguesas tienen bigote" ou "que desorden es todo, vamos que parece que no hay nadie que controla donde construir" e pior chegar a casa e ouvir os comentarios dos meus compratiotas a dizer que em Espanha é que é bom... e mais uma vez relato uma forma de agressão verbal, não é nada que se compare a ser espancado por ser amarelo, mas às vezes deparas-te com mitos que faria derreter a tinta das paredes de tão descabelados que são!


Enfim se emigrante é passar por provações guardando as distâncias com o tempo e as condições em que me descrevem os emigrantes, sou um! Se implica cruzar fronteiras, também,... se sou de luxo ou não fico à espera dos comentários.



5 Responses
  1. Mara Alina Says:

    Se soubesses as piadinhas que tive de ouvir sobre bigodes e a imensa curiosidade dos belgas sobre a pilosidade feminina portuguesa..... como eu te entendo!!


  2. Sempre pensei que as pessoas de Valladolid debem ser um bocado... exquisitas. Não são normais aqueles comentarios, que podem ser até dignos de uma Reclamação no banco Santander por exemplo...

    En medicina acho que somos todos mais fechados pela dura competença interior que nos temos... acho que em outras faculdades não acontece...

    Emigrar não é facil nem sera nunca, porque tens de começar praticamente de novo, tens saudades da tua vida anterior,... e muitos muitos problemas novos como pode ser a lingua, não só a lingua "oficial" (o espanhol de livro), se não o espanhol "coloquial", que é o pior...

    Além disso, na Espanha, como em muitos outros paises (imagino), temos muitas pessoas que não sabem do que estão a falar, e tem prejuizos (que não é uma outra coisa que pensar que são melhores só por ser espanhois), mas não debes ter em conta os seus comentarios, porque não são pessoas representativas, e a sua opinião é muito particular e não corresponde geralmente a opinião do resto dos espanhois.

    Do comentario dos bigodes femininos e tal... eu nunca ouvi isso, mas posso acreditar. Se bem, também tenho de dizer que isso acontece também dentro das nossas fronteiras, entre diferentes cidades e aldeias... não é exquisito... mas penso que é uma coisa "cultural" que tudos dizem como piada, mas ninguem realmente acredita... (penso eu)


  3. Unknown Says:

    Os cmentários do Banco foram alvo de reclamação e ao nível do Banco de España inclusivé, ainda tenho as cartas em casa!
    Certo é também que retrato o pior de Valladolid e seria injusto se não dissesse que existem excepções ao que descrevo, várias, só para citar as pessoas mais simpáticas comigo: Isa, Africa, Samu(el), a minha vizinha do apartamento que comparti com Lara que adorava as receitas dos meus bolos, ou os vizinhos do andar de cima, com quem passei umas noites agradáveis, o conserje da fac de Medicina que sempre me chamou joão e por conivência nunca soube o seu nome, o dono do café Los Angeles, Manolo (que afectuosamente lhe chamo CancerMan), o pessoal que trabalhou comigo em PizzaMóvil (Santi em concreto), JB,...bem e outras mais das que era possivel fazer um (ou mais que um post) de coisas positivas sobre Valladolid, mas normalmente impacta mais essa primeira impressão de exclusão e que pela repetição, e às vezes pela gravidade que assumiram determinadas situações em diferentes pontos da minha passagem por aqui e a influência que teve na forma de me relacionar com as pessoas é como que ponto de base para que se entenda o que descreverei mais adiante.

    Na verdade o post surge como conclusão de uma conversa pendente com o meu pai e o meu tio e um pouco de introdução ao meu processo de paz com tudo o que vivi aqui que espero ir plasmando segundo este avance e as musas mo permitam!

    Mas fico à espera da resposta À pergunta emigrante deLuxe 2.0 ou não?


  4. O Luis, tu viveste aquela situação e é a tua opinião.

    Só estou a dizer que na vida, há muitas pessoas prejuiziosas, que vão considerarte mal por coisas "injustas", e isso pode acontecer em Espanha, Portugal ou onde estes a trabalhar...

    Por exemplo, na minha região "Andalucía" as aldeias estão enfrentadas. Úbeda e Baeza são Patrimonio da Humanidade juntas, mas não são irmãs... Os baezanos chaman "bacines" aos ubetenses, e os ubetenses chamamos "bamboyas" aos baezanos (são termos despectivos, quasi insultos, mas não tem significado em espanhol, e acho que não existen nos diccionarios). Por supuesto, um ubetense na minha cidade sempre vai ser melhor que qualquer baezano e viceversa.

    Também há muitas pessoas incultas que falan por falar, mas sem saber nada.

    Por tanto, cada um debe dar importancia aos comentarios das pessoas que realmente saivan do que estão a falar, e as pessoas que um reconheça valor...

    Por exemplo quando estão a criticar aos médicos "por criticar" e sem saber... não podes sentirte afectado nem podes ter en consideração essas criticas. O melhor é directamente "passar" e não participar en conversações de pessoas ignorantes que se crescem ante um estrangeiro, mas que não demostran ser melhores...

    Probavelmente com o tempo que estiveste em Espanha já reconheças esta situação e comprendas que uma pessoa não pode sentirse afectada por comentarios de pessoas estupidas que não saben o que estão a dizer... (e nos vamos ter muitos muitos no futuro... de certeza... hehehe).

    Continuo sem perceber a pergunta do emigrante de Luxe 2.0 ... não sei o que estas a perguntar.


  5. LA Says:

    De luxo!
    N sou a única


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